domingo, 27 de setembro de 2015

"O Guardião Invisível" abre trilogia de Dolores Redondo

Os elogios da capa, atribuídos a El País, não traduzem minha impressão sobre "O Guardião Invisível", primeiro romance da trilogia sobre o trabalho da investigadora Amaia Salazar no vale do rio Baztán. Chego à página 360 com o incômodo de uma obra potencialmente boa que vai se confundindo a ponto de chegar ao vazio dos lugares-comuns. Não gostei do livro, apesar da leitura agradável pela escrita equilibrada. Poderia ter apreciado muito mais. Certamente não será daqueles livros que parecem eternos em minha memória.
Criada pela escritora Dolores Redondo, Amaia fascina como a mistura de policial destemida e mulher frágil, pelos momentos de paixão ao seu fiel marido, pelos erros e acertos que fazem dela uma pobre mortal e, ao mesmo tempo, a heroína que persegue a justiça. Porém, em "O Guardião Invisível", o primeiro que li da escritora que se dedica à gastronomia, notei que o enredo vai tomando formas tão díspares que se perde numa trama que tinha tudo para ser ótima, mas decepciona nos minutos finais, como aquele corredor que inicia na frente de todos e perde o impulso perto da chegada.
A história gira em torno da investigação, por Amaia e sua equipe masculina de inspetores, de crimes cometidos a adolescentes. O criminoso, que tudo leva a crer ser um serial killer, tem uma assinatura especial: um doce típico que deposita no ventre de suas vítimas. O crime faz ela voltar à sua cidade de origem, o pequeno povoado de Elizondo, e se confrontar com um passado traumático que a persegue desde a infância. No decorrer das páginas, ora acompanhamos a ação da investigadora, diretamente ligada às relações familiares e às crenças folclóricas locais, ora espreitamos Amaia ainda menina na doceria (!) que pertenceu a seus pais.
No povoado, com seu marido à tiracolo, a policial retoma suas origens na atualidade e é assolada por terríveis pesadelos que precisa esclarecer. Inicialmente cética em relação ao que não pode explicar, vai sucumbindo às crenças populares até abraçar seu lado místico. Outro aspecto obscuro que precisa lidar é a razão que a impede de engravidar, situação compartilhada pelas irmãs.
O livro é um romance policial, mas também ficção fantástica, onde a realidade não é relatada em fatos consistentes que nos convencem, mas flerta com seres lendários e o poder dos oráculos. Como disse, tem todos os ingredientes para uma receita de sucesso, mas o bolo infelizmente não cresceu. As únicas partes do livro que me fizeram pensar foram as que abordaram o quanto uma criança pode ser marcada por acontecimentos que fogem a seu controle, como um transtorno mental, por exemplo, sem contar com a proteção de adultos que deveriam estar a seu lado, mas preferiram se esquivar em nome da segurança das convenções sociais.

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